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Trabalho dos agentes de saúde gera uma economia anual de R$ 181 bilhões aos cofres públicos.

        Os agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias mudaram a realidade da saúde pública brasileira. — Fotomontagem: Samuel Camêlo, JASB. 
 
Trabalho dos agentes de saúde gera uma economia anual de R$ 181 bilhões aos cofres públicos 
Publicado no JASB em 6.junho.2023. Atualizado em 07.novembro.2023.          

Grupos no WhatsApp A verdadeira valorização dos agentes comunitários de saúde (ACS) e agentes de combate às endemias (ACE) não está no reconhecimento dos gestores ou da sociedade, mas, nos resultados que se consolidam do trabalho dessas duas categorias. Ainda que todo o processo de trabalho fosse inteiramente voluntário, os resultados revelam o quanto o trabalho os agentes são financeiramente viável. Saiba mais detalhes, agora! Por Samuel Camêlo*
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O editorial do JASB - Jornal dos Agentes de Saúde do Brasil fez uma avaliação sobre o impacto positivo do trabalho realizado pelos agentes comunitários e de combate às endemias gera uma economia do Brasil. E o resultado dessa avaliação foi impressionante.

De onde veio os dados

Para fazer a avaliação uma série de dados foram levantados juntos ao Ministério da Saúde, instituição responsável pelo pagamento dos salários dos agentes de saúde (ACS e ACE).

Com base nos dados recolhidos é possível chegarmos a cifra de uma economia anual de mais de R$ 181 bilhões, gerados em favor dos cofres públicos da prefeituras de todo o Brasil. Antes de festejar, confira conosco quais foram as variáveis que foram levados em conta, até o resultado fosse consolidado. 

Questionamento a ser levado em conta

Há uma série de questionamentos a serem feitos sobre as questões que vão envolve a falta de valorização dos agentes comunitários e de combate às endemias, inclusive, que remete ao que pode ser chamado de paradoxo (contradição) da administração pública dos municípios do Brasil. 
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Historicamente estamos tratando de duas categorias profissionais historicamente, mal remuneradas e que, infelizmente, não consegue ter acesso aos seus direitos fundamentais.

Quase 400 mil agentes

Atualmente os agentes, objeto desta análise, somam mais de 380 mil (entre ACS e ACE). São profissionais que conseguem ser protagonista de resultados tão positivos, que os reflexos ultrapassam as fronteiras do Brasil, inclusive, do continente. Atingindo a Europa, precisamente Portugal e o Reino Unido. Países que estudam os impactos positivos gerado pelo trabalho dos agentes de saúde. 
        Os agentes de saúde produzem saúde e economia aos municípios e estados brasileiros. — Foto/Reprodução/Freepik.

Como esse profissionais tão essenciais na produção da saúde pública são precarizados por décadas, a ponto de não ter acesso a direitos básicos em suas próprias cidades? Como servidores públicos municipais são castrados do acesso aos seus direitos, mesmo com  referenciais tão positivos na saúde pública de um país continental como o nosso? São perguntas sem respostas, em face da loucura que a realidade dos servidores descreve.
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Recursos investidos nos agentes

Em 2021, o Governo Federal, por meio do FNS - Fundo Nacional de Saúde, repassou o valor total de  R$ 4,8 bilhões para o pagamento dos salários dos 385 mil agentes comunitários de saúde e de combate às endemias. Injustificadamente, parte desses recursos não foram utilizados para pagar o salário base dos ACS/ACE. Na ocasião, os governos municipais recebiam R$ 1.550,00 (mil quinhentos e cinquenta reais) por cada ACS e ACE.  

Ao avaliar o valor de R$ 4,8 bilhões, repassados aos municípios, conforme  informações publicada pelo Ministério da Saúde, fazendo o cruzamento como o total de agentes, no caso, 381 mil ACS/ACE (286 mil agentes comunitários e 95 mil agentes de combate a endemias), fazendo um cálculo básico, usando esses dados, chegamos a valores diferenciados, no caso R$ 1.550,00 vezes o total de agentes, encontraremos o valor de R$  590.550.000,00. Este é o investimento mensal realizado pela União na categoria. Agora, ao multiplicarmos esse valor ao ano, encontraremos R$  7.086.600.000,00 ou seja, chegamos a pouco mais de sete bilhões de reais. Sem levar em conta a parcela extra do Incentivo Financeiro Adicional. Contudo, o repasse dos R$ 4,8 bilhões citados pelo Ministério da Saúde, representou um repasse de quase R$ 2.3 bilhões a menos aos municípios, se levarmos em conta a simulação que estamos realizando.

Os valores estabelecidos pela EC 120

Em maio de 2022, a PEC 22/2011 foi aprovada na Câmara do Deputados, em Brasília. Depois a PEC 09/22, no Senado, dando origem à Emenda Constitucional (EC) 120. Entre diversos outros direitos, a alteração do texto constitucional garantiu o salário base de 2 salários aos agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias. Hoje, esse valor é de R$ 2.640,00. 
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Dados que apontam a economia de mais de R$ 12 bilhões

Com base nos números descritos nessa matéria, considerando que, para cada R$ 1,00 investido nos agentes, temos a economia de, no mínimo, R$ 15,00 com a prevenção em saúde em 2023. Levando em conta a simulação de que o investimento que o Ministério da Saúde deveria fazer  em junho de 2023, deveria ser de R$ 2.640,00 vezes o número de ACS e ACE existente no Brasil, ou seja, 381 mil ACS/ACE chegamos ao valor de R$ 1.005.840.000 (um bilhão, cinco milhões e oitocentos mil reais). Usando a mesma base de cálculo, chegamos ao valor anual de R$ 12.070.080.000 (doze bilhões, setenta milhões e oitenta mil reais). Esse é valor total que deveria ser investido no salário das duas categorias durante o ano. 

        Os agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias mudaram a realidade da saúde pública brasileira. — Foto/Reprodução/Freepik.

Tomando o resultado obtido, considerando os 2 salários mínimos fixados pela EC 120 e o valor anual, que deveria ser repassado pelo Ministério da Saúde aos Municípios, que é de pouco mais de 12 bilhões,  chegamos a uma economia de R$ 181.051.200.000 (cento e oitenta e um bilhões, cinquenta e um milhões e duzentos mil reais) produzida pelo trabalho dos agentes comunitários e de combate às endemias. Destacando a análise de que para cada R$ 1 investidos nas duas categorias, temos R$ 15 economizado com a ação preventiva em saúde. 
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Há uma grande contradição (paradoxo) em relação ao potencial econômico gerado pelo trabalho dos agentes, se comparado com o que estabelece a Lei Federal nº 11.350, de 5 de outubro de 2006, que regulamenta o § 5º do art. 198 da Constituição, dispõe sobre o aproveitamento de pessoal com fundamento no parágrafo único do art. 2º da Emenda Constitucional nº 51, de 14 de fevereiro de 2006; Decreto nº 8.474, de 22 de junho de 2015, que regulamenta o disposto no § 1º do art. 9º-C e no § 1º do art. 9º- D da Lei nº 11.350, de 5 de outubro de 2006, para dispor sobre as atividades de ACS e de ACE; Lei Federal nº 13.595, de 5 de janeiro de 2018, que altera a Lei nº 11.350, para dispor sobre a reformulação das atribuições, a jornada e as condições de trabalho, o grau de formação profissional, os cursos de formação técnica e continuada e a indenização de transporte dos agentes; considerando a Lei Federal nº 13.708, de 14 de agosto de 2018, que altera a Lei nº 11.350, para modificar normas que regulam o exercício profissional desses agentes de saúde, por fim, a relevantíssima conquista dos direitos descritos na Emenda Constitucional 120, de 05 de maio de 2022.

O papel dos  Agentes Comunitários de Saúde vai muito além da medicina preventiva, o que justifica a existência do impacto positivo direto na economia dos recursos públicos do país. Assim como o trabalho do Agente de Combate às Endemias, vai além do controle da dengue, pragas, eles projetam a qualidade de vida e prevenção de doenças para pessoas que vivem em comunidades carentes, por meio de visitas às residências das famílias ou em ações coletivas. Contudo, por que há a resistência em respeitar os direitos conquistados por essas duas categorias? 
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Administrando o dinheiro dos cofres públicos

Em tempos de crise financeira, quando é necessário administrar os recursos financeiros existentes da melhor forma possível, sabendo que as prioridades devem ser preservadas, tal fato acaba por elevar a tenção entre os interesses dos trabalhadores/as e de grupos políticos que não respeitam os direitos dos servidores públicos municipais. Tal fato, sem dúvida alguma, acaba impedindo as melhorias da qualidade do trabalho dos agentes, devido a ausência de motivação e ânimo na produção de resultados. 

        Trabalho dos agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias garante uma maior estabilidade aos cofres públicos com a economia do investimento em saúde. — Foto/Reprodução/Freepik.

Fato absurdo

A maior prova de que existe falta de interesse em remunerar adequadamente os ACS/ACE remete a mãe de todos os fatos, que é o  tempo decorrido até que fosse aprovada a EC 120. A luta pelo Piso Salarial Nacional de 2 salários, teve início em 2006 e somente atingiu o alvo em 2022, ou seja, 16 anos após o início da luta. 

No contexto nacional atual é muito importante que seja compartilhado as informações sobre a excelência do trabalho realizado pelos Agentes de Saúde (ACS e ACE). É impossível debater a Saúde Pública Brasileira, sem fazer menção àqueles que formam o elo entre os interesses da comunidade e os interesses do poder público.
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Apesar dos fatos descritos nessa matéria, é inegável reconhecer que há uma variedade de grupos políticos que impedem as melhorias no trabalho desses agentes, exercendo influências perversas sobre a representação da categoria. Dessa forma, mantendo os agentes num estado de “atrofia profissional,” resultando em salários que já passou por quase 5 anos de congelamento.


Outros aspectos positivos do trabalho dos ACS/ACE

Além da importância econômica para os cofres públicos dos municípios, estados e país, os agentes são educadores sociais, por tanto, responsáveis por um impacto social positivo para toda a nação. 

Melhorar a qualidade de trabalho do Agente Comunitários de Saúde e Agentes de Combate às Endemias é impulsionar os resultados produzidos pelo trabalho de cada agente, em síntese, é leva-los a ter maior consciência sobre o seu papel de transformação na saúde pública brasileira. Se apropriar desse potencial assusta aos detentores de legados políticos nas bases parlamentares. Para esses políticos é mais fácil controlar as repercussões da influência desses agentes sobre as suas comunidades, limitando o potencial de articulação.
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Samuel Camêlo* – Coordenador da rede de voluntários da MNAS - Mobilização Nacional dos Agentes de Saúde e Jornal dos Agentes de Saúde do Brasil. Agente de Saúde, Bacharel em Direito, Licenciado em História e pós-graduado em História do NE.


Conheça 8 propostas que, se aprovadas, vão beneficiar Agentes Comunitários e de Endemias.

        Agentes comunitários de saúde e de combate às endemias estão diante de excelentes possibilidades de melhoria em seus rendimentos financeiros. — Foto/Reprodução.
 
Publicado no JASB em 20.junho.2023.  Atualizado em 27.agosto.2023.         

Graças a união dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS) e Agentes de Combate a Endemias (ACE) atualmente há maior possibilidade de ampliação do leque de direitos conquistados. Compreenda a situação, leia a matéria completa.

A vitória estabelecida por meio da Emenda Constitucional 120, em maio de 2022, não apenas abriu as portas para uma conquista que demorou 16 anos para ocorrer, considerando que as articulações para obter o Piso Nacional de valor igual aos 2 salários mínimos teve início em 2006. A citada Emenda, não apenas trouxe uma série de conquista, além do novo valor do Piso, mas, abriu as portara para uma nova realidade diante do Congresso Nacional.

Antes de nos aprofundarmos nas questões relacionadas à Meca do poder político no Brasil, analisemos algumas questões de elevado potencial, dado a importância.

Reconhecimento Internacional

Os Agentes Comunitários e de Combate a Endemias  brasileiros ocupam um papel importantíssimo na prevenção de doenças e promoção de saúde em ações domiciliares, comunitárias, individuais e coletivas no país. Tal situação já produz reflexos muito além das fronteiras de nosso país, inclusive, com ecos importantíssimos na Europa. 
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Um SUS cada vez mais forte

Lotados nas secretarias municipais de saúde como trabalhadores do SUS, os agentes que têm um papel fundamental na vida de milhões de brasileiros, conquistaram recentemente, por meio da sanção do Projeto de Lei 1802/19, um direito importante: o reconhecimento como profissionais de saúde.

Os  ACS brasileiros e os britânicos 

No início do mês apresentamos uma importantíssima matéria sobre o pesquisador e clínico geral Matthew Harris. Ele passou quatro anos num posto de saúde de uma cidade pernambucana. Ao voltar para casa, resolveu replicar a experiência vivida na Estratégia Saúde da Família no sistema público britânico.

O médico inglês, que  hoje trabalha em Londres, em um projeto inspirado no que aprendeu com o Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro, inclusive, tem dado destaque ao trabalho dos ACS (veja mais detalhes, logo após esta matéria).

De volta aos Projetos que tramitam em Brasília

Há um grande volume de projetos que tramitam no Congresso Nacional e são de grande importância, tanto para os agentes comunitários quanto para os de endemias. Eles realmente buscam realizar a valorização e o reconhecimento dessas duas categorias.  

Inúmeras associações, sindicatos, federações e a CONACS focam na conquista de novos direitos, além de garantir os já conquistados. 

Mais dinheiro e menos impostos

A isenção da declaração do imposto de renda (PL 3044/22) e pagamento do piso salarial diferencia de três salários mínimos (PEC 18/22) representam uma ampliação muito significativa do potencial financeiro tanto dos ACS quanto dos ACE. Contudo, há outras propostas em tramitação que podem mudar a vida de cada um desses agentes, elevando de forma significativa o potencial econômico. 
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Os principais projetos em tramitação  

1. PEC 18/2022

 Acrescenta o § 9º-A ao art. 198 da Constituição Federal, para criar piso salarial diferenciado de três salários mínimos para os agentes comunitários de saúde e os agentes de combate às endemias detentores de formação técnica, nos termos da lei específica.

2. PL 1.336/2022

Determina que os agentes comunitários de saúde e os agentes de combate a endemias terão direito a adicional de insalubridade em grau máximo de 40%, calculado sobre os vencimentos. O texto em análise na Câmara dos Deputados insere o dispositivo na lei 11.350/2006.

3. PL 5.312/2016

Altera o art. 9º-A da Lei nº 11.530, de 5 de outubro de 2006, para dispor sobre a redução da jornada de trabalho dos Agentes Comunitários de Saúde e dos Agentes de Combate às Endemias para 30 horas semanais.

4. PL 4.440/2020

Prevê pagamento de incentivo adicional aos agentes comunitários de saúde e de combate às endemias. O texto altera a Lei 11.350/2006, que regulamenta as atividades desses agentes. A lei já prevê incentivo financeiro a ser pago aos municípios e repassado aos agentes e não permite o recurso ser usado com outra finalidade.

5. PL 460/2019

Torna obrigatório o pagamento direto aos agentes comunitários de saúde e combate a endemias (ACS e ACE) do incentivo financeiro criado em 2014. Esse benefício é regulamentado por decreto (8.474/15) e leva em conta os profissionais com vínculo efetivo.
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6. PL 3.044/2022

Dispõe sobre a isenção e a dispensa na apresentação da Declaração Anual do Imposto de Renda para os Agentes Comunitários de Saúde e Agentes de Combate as Endemias.

7. PLP 86/2022:
Conforme o Projeto de Lei Complementar PLP 86/2022, proposto por Valtenir Pereira, no Art. 2º: Aos Agentes Comunitários de Saúde e de Agentes de Combate às Endemias será concedida Aposentadoria na sua integralidade e de modo paritárioSaiba mais detalhes, aqui!

DEIXAR O SEU COMENTÁRIO SOBRE SOBRE AS PROPOSTAS, AQUI!


O que médico britânico aprendeu com Agentes de Saúde do Brasil e levou para Londres

        Profissionais de saúde a serviço do Sistema Único de Saúde. — Fotomontagem Samuel Camêlo, JASB.
 
Publicado no JASB em 9.junho.2023. Atualizado em 11.junho.2023.          

O pesquisador e clínico geral Matthew Harris passou quatro anos num posto de saúde de uma cidade pernambucana. Ao voltar para casa, resolveu replicar a Estratégia Saúde da Família no sistema público britânico.

O médico inglês Matthew Harris hoje trabalha, em Londres, em um projeto inspirado no que aprendeu com o Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro há mais de 20 anos.

Um ano depois de se formar em Medicina no Reino Unido, ele se mudou para Pernambuco em 1999 e, após passar pelas provas para revalidar o diploma no país, começou a atuar como clínico-geral de uma unidade de saúde no município de Camaragibe, na região metropolitana de Recife.

Harris permaneceu na clínica durante quatro anos. À época, ele não tinha ideia de que a experiência um tanto inusitada mudaria a carreira — e até provocaria transformações no Serviço Nacional de Saúde (NHS, na sigla em inglês) do Reino Unido duas décadas depois.
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Projeto que pretende implementar os ACS 

Atualmente, ele é pesquisador da Escola de Saúde Pública do Imperial College de Londres e lidera um projeto que pretende implementar os agentes comunitários de saúde, algo que existe no SUS há décadas, em território britânico.

Uma experiência baseada no modelo Brasileiro

O médico não faz cerimônia para dizer que essa iniciativa é 100% inspirada na Estratégia Saúde da Família (ESF), um programa criado pelo Ministério da Saúde do Brasil nos anos 1990 que segue ativo até hoje — e traz resultados muito celebrados por especialistas da área.

Reflexo na mídia Internacional

Harris recebeu a equipe da BBC News Brasil numa sala do Departamento de Atenção Primária e Saúde Pública da universidade, localizada no oeste da capital da Inglaterra, para compartilhar um pouco de sua história profissional e da iniciativa britânica inspirada no SUS.

        Médico Matthew Harris passou quatro anos trabalhando em Camaragibe (PE) — Foto: Giovanni Bello/BBC News Brasil

Os primeiros passos

O clínico geral conta que as condições de Camaragibe não eram as melhores lá em 1999. "Eu trabalhava numa área rural com cerca de 5 mil residentes", contextualiza.

Harris classifica as primeiras experiências práticas que teve na Medicina como "desafiadoras".
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"Eu acabara de sair da universidade, não possuía confiança absoluta para falar português e tinha que fazer meu trabalho numa comunidade muito pobre do Nordeste brasileiro", lembra ele.

"A clínica possuía apenas alguns poucos medicamentos enviados pela prefeitura. Era uma situação muito diferente da que estava acostumado no Reino Unido."

Coisas extraordinárias 

Apesar de todas as dificuldades, Harris rapidamente percebeu algo primordial. "Apesar de todos os desafios e da falta de recursos, ainda assim podemos fazer coisas extraordinárias na atenção básica de saúde", diz.

E, na visão dele, quem faz o elo dessa cadeia da saúde pública brasileira é um profissional chamado agente comunitário.

Esses indivíduos representam a pedra fundamental da Estratégia Saúde da Família (ESF). Criado nos anos 1990, o programa se baseia na premissa de os tais agentes visitarem a casa das pessoas de uma determinada região de um bairro ou de uma cidade.

O objetivo é entender e acompanhar os principais problemas de saúde que afligem aqueles indivíduos — e, claro, levar essas informações para os enfermeiros, auxiliares de enfermagem, médicos da família e clínicos gerais que estão na Unidade Básica de Saúde responsável por aquela localidade.
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Brasil conta com 49.172 equipes de Saúde da Família

Procurado pela reportagem, o Ministério da Saúde informou que o país conta atualmente com 49.172 equipes de Saúde da Família, que são responsáveis por atender 167 milhões de cidadãos cadastrados (ou 79% da população total) nos serviços de atenção primária, que são considerados pelo governo como "a porta de entrada para o SUS".

"Quando cheguei, não tinha a mínima noção de como o sistema de saúde pública do Brasil estava baseado nesses agentes comunitários", confessa Harris.

O médico inglês notou aos poucos como as informações obtidas por esses profissionais eram úteis no dia a dia. "Eles conhecem e compreendem o local onde atuam profundamente, nos mínimos detalhes", chama a atenção.

"Os agentes comunitários são os primeiros a saber sobre qualquer mudança que acontece. E essas informações são usadas de forma inteligente, antes que os problemas se tornem grandes demais", complementa.

        Profissionais de saúde a serviço do Sistema Único de Saúde. — Foto/Reprodução/ Getty Images via BBC.

Os agentes comunitários passam por cursos técnicos de formação organizados por prefeituras e outros órgãos em que aprendem sobre promoção de saúde e prevenção de doenças.
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Eles vão usar essas informações durante as entrevistas e conversas feitas nas visitas domiciliares. Se possuírem formação e tiverem a supervisão de um enfermeiro ou médico, eles também podem realizar exames simples, como medir a temperatura corporal, a glicemia e a pressão arterial das pessoas, ou averiguar se tratamentos medicamentosos contra doenças crônicas, como hipertensão e diabetes, estão sendo tomados.

Vidas salvas pela informação

Questionado pela BBC News Brasil sobre episódios específicos que marcaram sua carreira, Harris lembra da história de um menino de 11 anos que foi parar no pronto-socorro.

"Ele se queixava de dor de cabeça há vários dias. Infelizmente, o serviço de emergência só podia oferecer paracetamol e 'torcer' para que ele melhorasse", relata.

Mas o trabalho de um agente comunitário mudou essa história. "Durante uma visita de rotina, o profissional notou que o menino continuava mal e nos alertou. Os olhos incharam e ele parecia cada vez pior", conta.

Ao trazer o garoto para uma consulta, Harris notou duas coisas: a pressão arterial estava alterada e a criança apresentava um ferimento no pé.

"Ao juntar todas essas peças, pude fazer o diagnóstico de glomerulonefrite pós-estreptocócica", completa Harris.
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Essa doença de nome esquisito é uma complicação que acomete os rins de pacientes que tiveram uma infecção pela bactéria Streptococcus.

        Equipes de atenção básica atendem quase 80% da população brasileira. — Foto/Reprodução.
 
No caso desse episódio em Pernambuco, o médico suspeitou da condição ao somar as pistas do corte no pé (um indício de infecção bacteriana) com a pressão baixa e a dor de cabeça (que sugerem algo de errado nos rins).

"Se ele não fosse diagnosticado a tempo, provavelmente teria falência renal e acabaria morrendo", diz Harris. "Mas a detecção rápida a partir do trabalho do agente comunitário literalmente salvou a vida daquele garoto."

De volta à casa

Após quatro anos em terras pernambucanas, Harris retornou ao Reino Unido em 2003 com pelo menos uma certeza na bagagem: era necessário replicar a ESF no serviço de saúde pública britânico.

E uma tarefa dessa magnitude carrega uma série de simbolismos e significados.

Um dos principais deles é o fato de a criação do SUS no Brasil lá no final dos anos 1980 ter sido inspirada no NHS do Reino Unido — e, agora, esses papeis se inverterem.

        Nahima é uma das agentes comunitárias de saúde que trabalha em Londres. — Foto/Reprodução.

"Mesmo antes de voltar, eu já sabia imediatamente que aprendera algo com os brasileiros e precisava compartilhar isso. Eu necessitava dividir e abrir os olhos dos especialistas sobre os agentes comunitários", pontua.

"Todos precisam conhecer o modelo de sucesso do Brasil", recomenda o pesquisador.
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Mas a missão mostrou-se mais árdua do que ele imaginava.

"Infelizmente, levei entre 10 e 15 anos para explicar a importância de um sistema como o ESF porque as pessoas daqui não estão acostumadas com a realidade brasileira e têm representações erradas sobre o país", lamenta ele.

"Mas a verdade é que as realidades de Brasil e Reino Unido estão mais próximas do que se imagina. Há mais coisas que nos unem do que elementos que nos separam", acredita o médico.

"É claro que não temos aqui doenças como leptospirose, esquistossomose e dengue. Mas também sofremos com diabetes, tuberculose, hipertensão, depressão, asma, diarreia…", compara.

Influência da pandemia de covid-19

Harris avalia que um dos fatores que ajudou a acelerar processos e permitiu a instalação de uma ESF britânica preliminar foi a pandemia de covid-19.

"Nós argumentamos que precisávamos de um sistema de agentes comunitários de saúde como o do Brasil para acompanhar as pessoas de perto", destaca.

E assim a iniciativa ganhou vida: o projeto-piloto começou em Churchill Gardens Estate, um conjunto habitacional em Westminster, no centro de Londres.

Os primeiros resultados

Segundo Harris, a ideia inicial era checar se as pessoas estariam dispostas a abrir as portas de suas casas para conversar com os agentes de saúde.

"E logo nos seis primeiros meses nós percebemos que isso não apenas era possível, como também os moradores aceitavam muito bem a abordagem", informa.
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O médico calcula que, no primeiro ano e meio do projeto, cerca de 70% das moradias do bairro receberam ao menos uma visita dos profissionais da saúde.

"Os agentes conseguem estabelecer uma relação com as pessoas e entender realmente quais são as necessidades dela. O ponto importante é que eles próprios moram ali, então se veem como parte daquela comunidade", destaca.

Harris diz que a equipe fez alguns estudos para medir os resultados práticos da experiência.

"Quando comparamos os lares que receberam as visitas com aqueles que não fazem parte do projeto-piloto, percebemos que o primeiro grupo participou mais de campanhas de vacinação e fez exames de rotina com maior frequência", conta.


"Claro, não podemos provar que essa mudança está totalmente relacionada aos agentes de saúde. Mas é no mínimo sugestivo que isso tenha ocorrido a partir do início de trabalho desses profissionais", complementa.

Capacitados para identificar e  resolver os principais problemas

De acordo com o especialista, os funcionários do programa são capacitados para identificar e até resolver os principais problemas de saúde que estão acometendo cada família.

A partir disso, os indivíduos se veem mais livres e empoderados para cuidar de outros aspectos importantes, mas que estavam negligenciados, como atualizar a carteirinha de vacinação ou fazer os exames que detectam um câncer em estágio precoce.
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Aliás, o treinamento oferecido aos agentes comunitários britânicos foi basicamente o mesmo dado aos profissionais brasileiros.

Mas Harris acredita que os efeitos práticos de um projeto como o ESF vão além do aumento na taxa de imunizações ou de checkups.

"Em Churchill Gardens Estate, por exemplo, nós observamos que as pessoas moravam nas mesmas casas há muitos anos, mas não conheciam os vizinhos e nem se falavam. Porém, com as visitas dos agentes comunitários de porta em porta, houve uma mudança de atmosfera. Os moradores passaram a conversar mais e a marcar programas em conjunto, como um café", acrescenta.

O médico entende que a estratégia criou uma espécie de "coesão social" — algo muito parecido ao que ocorreu no próprio Brasil nas regiões atendidas há décadas pelo ESF.

O projeto-piloto já foi expandido para outras áreas de Londres e deve começar a ser aplicado em bairros de locais como Yorkshire e Liverpool.

Baixo custo, alto valor

Harris aponta que os países mais desenvolvidos, como o próprio Reino Unido, não prestam muita atenção ao que é feito em nações em desenvolvimento.

"Nossa tendência é acompanhar de perto o que acontece em lugares como Estados Unidos, Alemanha, Austrália ou Nova Zelândia e praticamente ignorar as políticas dos países da América Latina, da África e do Sudeste Asiático. Mas não há nenhuma boa razão para que isso seja assim", protesta.
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Para ele, o trabalho dos agentes comunitários de saúde é um exemplo desse cenário.

"A ESF do Brasil é um programa altamente custo-efetivo e ajuda a resolver os problemas mais comuns ao acompanhar as famílias de uma forma holística no lugar mais importante de todos: a casa delas", afirma Harris.

O especialista calcula que cerca de 40% das necessidades de saúde das pessoas podem ser atendidas pelos agentes comunitários durante as conversas e as visitas domiciliares.

"Eles podem falar das vacinas, ficar atentos a sintomas de doenças crônicas [como hipertensão e diabetes], lidar com feridas, sugerir a realização de exames de rotina ou simplesmente checar se a pessoa está tomando os remédios corretamente", exemplifica.

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Por fim, o pesquisador do Imperial College destaca como, em determinadas situações, soluções simples e baratas em saúde podem trazer resultados extraordinários.

"É claro que temos espaço para tecnologias sofisticadas, que expandem as fronteiras da Medicina", opina.

"Mas algumas vezes eu sinto que vamos além do necessário e nos esquecemos que as intervenções mais básicas podem fazer toda a diferença", conclui ele.

Por BBC

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